Diario de Noticias
22 de Fevereiro de 2001
Hospital Militar tem resposta
Pai de Hugo Paulino garante que o HMP possui tecidos do corpo do seu filho para que sejam efectuados novos exames
Graça Henriques
Lília Bernardes
Arquivo DN-José Carlos Carvalho

AUTÓPSIA. A família do soldado ainda não decidiu se autoriza a exumação do corpo do 1.º cabo Hugo Paulino

O pai do 1.º cabo Hugo Paulino, o jovem português que faleceu em Março do ano passado após missão no Kosovo, estranha que o primeiro-ministro diga que o Governo está interessado na exumação do cadáver do militar para que seja feita uma segunda autópsia. "Não percebo porque é que o primeiro-ministro vem agora falar na exumação do corpo quando existem tecidos do meu filho no Hospital Militar Principal (HMP) de Lisboa", afirmou ao DN, Luis Paulino. "Quando eu próprio defendi a exumação do corpo, foi a directora do serviço de anatomia patológica do HMP, dr.ª Ana Paula Horta, que me disse não ser necessário porque existiam tecidos e nomeadamente o cérebro estava conservado em formol", acrescentou o pai do militar, afirmando que existem testemunhas desta conversa com a responsável do Hospital Militar. Aliás, refere ainda Luis Paulino, "a dr.ª Ana Paula também me disse que não encontrava nada de plausível que justificasse a morte do meu filho".

Apesar de estranhar esta insistência do Governo numa segunda autópsia, o pai do militar português está a ponderar se autoriza ou não a exumação do cadáver do filho. "Só se disserem que não existem esses tecidos do meu filho no Hospital Militar é que irei ponderar o assunto", disse ao DN, lembrando que também ninguém o consultou quando o filho morreu e "decidiram fazer a autópsia clínica no HMP e não uma autópsia legal".

De acordo com Luis Paulino, "através do meu advogado, o general Martins Barrento vai ser questionado, como responsável máximo pelo Exército, pois queremos saber quem autorizou a autópsia clínica e porque não foi feita a autópsia legal, que seria mais conclusiva sobre as causas da morte". O falecimento de Hugo Paulino foi, segundo esta autópsia, devido a uma "septicémia", facto contestado pelo seu pai ao afirmar que "com tantos vírus que há nos hospitais, foi fácil atribuir a causa da morte a uma septicémia".

Um outro problema se coloca quanto à realização da exumação do cadáver. É que o corpo de Luis Paulino, falecido há praticamente um ano, está em urna de chumbo num jazigo, o que pode significar uma alteração química nos tecidos a reanalisar.

De acordo com uma médica especialista em anatomia patológica, consultada pelo DN, "só um físico poderá dizer se, um ano depois da morte, é possível detectar radioactividade no cadáver". Mas, adianta, "se os colegas que fizeram a autópsia recolheram fragmentos do encéfalo e os fixaram em blocos de parafina é hoje possível através de técnicas sofisticadas - microscópio electrónico ou técnica de biologia molecular - determinar se, de facto, há inclusões virais".

Segundo esta especialista, "se houve colheita deste material, o Hospital Militar deverá, a qualquer momento, poder colocá-lo à disposição no sentido de serem aplicadas as técnicas que referi. Se se provar a radioactividade e, se nos fragmentos colhidos na altura se comprovar que existem inclusões virais, confirma-se o diagnóstico... sendo que depois poder-se-ia estabelecer uma relação causa/efeito".

O DN revelou ontem as conclusões de dois relatórios efectuados por médicos independentes e que tiveram como base de trabalho os estudos clínicos diários efectuados a Hugo Paulino enquanto hospitalizado (ver peça ao lado). Os médicos assumem que o 1.º cabo morreu devido a contaminação tóxica provocada por armamento utilizado nos Balcãs (urânio empobrecido).

O primeiro-ministro reafirmou ontem o interesse do Governo na exumação do cadáver "para que seja apurada toda a verdade". Guterres salientou ainda, segunda a Lusa, que não deve haver polémicas em torno destas matérias.

Parlamento debate envio de tropas

O Governo e o CDS/PP não quiseram deixar o PSD a legislar sozinho sobre o envio de tropas portuguesas para missões no estrangeiro e agendaram, na conferência de líderes parlamentares de ontem, propostas neste sentido a serem debatidas hoje.

Os sociais-democratas já tinham usado a figura do agendamento potestativo (obrigatório) para levar a plenário um projecto que visa que o Parlamento seja previamente ouvido sempre que o Governo decida enviar tropas portuguesas a prestar serviço e missões no estrangeiro.